Alma da Bola

alma=princípio da vida, sentimento, generosidade, coração
bola= artefato esférico de borracha ou de outro material, freqüentemente envolto de couro, que, em geral salta por efeito da elasticcidade, e é usado em diversos esportes

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Local: São Paulo, SP, Brazil

Jornalista especializado em marketing esportivo. Gosta de história e de uma boa cerveja.

terça-feira, agosto 26, 2014

Um sentido para a vida


Hoje, meu Palmeiras faz 100 anos. A minha maior paixão dentro da minha grande paixão que é o futebol, mas também muito mais que isso. Acredito que ter um time para torcer é ter um atalho (ou até uma condição) para conviver socialmente, se relacionar com os outros e, no meu caso, conviver com o local onde fui criado: o bairro da Lapa, assim como as adjacências das Perdizes, da Pompéia, da Água Branca e de toda a imediação.

Não sei ao certo porquê me tornei palmeirense. Tampouco quando. Pode ter sido coisa de meu pai, embora ele nem seja tão fanático assim. Talvez minha mãe, influenciada pelos irmãos. Ou, ainda, a atmosfera da colônia italiana, a qual eu estava inserido localmente (o mais provável é que tenha sido por uma combinação de todos esses fatores). Lembro apenas que desde muito cedo, eu já tinha uma bola dente de leite do Palestra, mal sabia o que era, mas ela já estava lá, nas minhas primeiras fotografias com um enorme “P” estampado. Só não sei por que era preta e branca.

Certa vez (talvez eu tivesse três ou quatro anos), ocorreu uma das minhas primeiras memórias de palmeirense. Alguém me perguntou para quem eu torcia e respondi: “Pro Palmeiras”.
Dentro de campo, confesso, não lembro do fiasco de 1986, quando perdemos o Paulistão para a Inter de Limeira. Mas lembro muito bem daquele infeliz 3x0 para o Bragantino, acho que em 1990. Ah, teve também aquele dia em que a torcida destruiu a sala de troféus, quando perdemos para o Novo Horizontino.



E, foi assim que eu cresci vendo meu time... Perdendo. Pouco hedonista, mas, de verdade, pouco me importava. Foi nessa fase da vida que percebi que hegemonia, beleza ou sucesso pouco tinham a ver com o amor ou a felicidade. Ou seja, além de tudo, o Palestra foi uma boa Escola para a minha vida, pois me ensinou a enxergar o mundo desta maneira.

Os anos 1980 foram difíceis. O time nada ganhava e nada ganhou, como a história comprova. Meus vizinhos da Rua Barra do Chapéu aproveitavam disso para tripudiar coisas do tipo: “Você nunca viu seu time ser campeão!”. Eu até ficava chateado, mas em nenhum momento pensei em mudar. Já na escola, o quadro era diferente, e a maioria dos amigos também era palmeirense. Ou seja, graças ao Verdão vi que diferentes leituras do mesmo mundo eram possíveis.

Até que um dia, vejo em uma banca de jornal uma flâmula. Tinha o símbolo e a frase capital: “Campeão ou não, tu és minha paixão”. Aquela frase me pegou de um jeito, que até hoje me arrepia. A consequência é que me identifiquei ainda mais com o time.

Palmeiras é, além de tudo, proximidade, uma espécie de identidade nacional, pois por ser muito próximo de minha casa, sempre senti que torcia o time do bairro. Em tempos de globalização do futebol isso parece no mínimo irônico.

Veio um dia a Parmalat. Um dia dos namorados em 1993 e o momento máximo de excitação com a minha maior paixão até aquele momento: o Título Paulista. Um grito de campeão, que “estava entalado na garganta” e que teve a proeza de me dar minha primeira lembrança de problema nos estômago (anos depois descobri uma úlcera, mas isso não foi só pelo Palestra).



Sabe sempre levar de vencida e mostrar, que de fato é Campeão

Lembro de detalhes daquele jogo. Com poucos minutos de jogo o animal Edmundo perdendo um gol em cima da linha, o pessoal na sala de casa, minha mãe que não sabia se assistia ao jogo ou se ouvia a narração de Fiori Gigliotti pela Rádio Bandeirantes, do pênalti cobrado pelo matador Evair. Porém a grande lembrança foi quando fomos para as ruas gritar “É campeão”. A torcida fechava a Avenida Francisco Matarazzo. Eis que uma estranha movimentação na pista sentido centro. Era o ônibus do campeão. Um alvoroço total. Uns queriam subir, outros cercavam o veículo. Então, no auge de meu onze anos, minha retina gravou uma das lembranças inesquecíveis. Pelo alçapão do ônibus, Evair, o herói da conquista, empunhava e agitava uma bandeira. Essa é a grande imagem que tenho de 1993.

Veio então uma enxurrada de títulos. As lembranças de outros grandes ídolos como, César Sampaio (ah, aquele gol contra o São Paulo), Roberto Carlos (o início de uma belíssima carreira), Edílson (que depois nos traiu de uma maneira boba), Zinho (o autor do gol da mais emocionante da minha vida), Mazinho (que jogava muita bola, sempre de peito cheio e cabeça erguida), Amaral (o incansável), Rivaldo (o mais reconhecido internacionalmente), Djalminha (talvez o mais habilidoso de todos), Luizão (segundo matador), Junior (como jogou este substituto), Alex (o último craque que vi), Euller (o filho do vento), Oséas (aquele gol contra não é nada), Paulo Nunes (que sempre deixava sua marca), Galeano (pelos anos de dedicação, mas também pelo gol na Libertadores de 2000) e um tal São Marcos (o maior de todos).

Este época, no final dos anos 1990, deixou-me um palmeirense vencedor, fanático (adorava usar a camisa ou a cor verde) mas não menos orgulhoso que nos tempos de vacas magras. “O campeão ou não” ficou em minha mente. Creio que a vida é e deve ser pensada assim, menos utilitária e mais apaixonada.
Tanto que nos últimos anos, sinto um Palmeiras muito parecido com o do começo da relação amorosa. Enfraquecido em campo, forte na vida.

Senti isso hoje, em frente às obras do Palestra Itália ou Parque Antarctica, como diriam os mais antigos. Fiquei atônito e arrepiado diante da grandeza. A memória foi longe. Lembrei da primeira vez que entrei no jardim suspenso em jogo da Copa São Paulo (acho que em 1993). Meu pai e eu ficamos nas numeradas descobertas (no lado da Rua Turiassú) e um meia negro, chamado Juari, impressionava todos.

Lembrei de outros tantos jogos dos Campeonatos Paulista, Brasileiro, Rio-SãoPaulo, Libertadores. Lembrei ainda da época que fui sócio do clube por algum tempo e adorava circular pelas dependências encontrando craques do passado como Oberdan ou Ademir.

Parabéns, Palmeiras! Obrigado por dar sentido a minha vida, campeão ou não.

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posted by Guy Júnior | 10:08 AM | 0 comments